PAISAGENS CAPIXABAS CAPRICHADAS
(Publicado em A Tribuna, 27/11/2012)
Em 1966 participei do I Salão Nacional de Artes Plásticas do Espírito Santo. Minhas telas, consideradas de vanguarda, foram pintadas com piche que obtive raspando o primeiro asfalto da Av. Champagnat, Vila Velha. As pinturas consistiam em traços e figuras geométricas pintadas sobre telas brancas (influência da pop e da op-art, estéticas predominantes naquele tempo) e cobertas com veladuras (camadas finas, translúcidas) de betume dissolvido com querosene.
Recebi elogio de Homero Massena publicado em A Gazeta, 18 de setembro de 1966, em forma de crônica, que terminava assim: “A próxima exposição pessoal que fará Kleber Galvêas será apreciada pelos nossos conterrâneos momento em que verificarão a verdade do que aqui afirmamos”. Isso me deu confiança e muita ousadia.
Em 1967, com 19 anos, a bordo do cargueiro Loyd Nicarágua, embarquei para Barcelona. Nos museus da Europa ocidental devorei os pintores clássicos e modernos; fiz curso de Gravura em Metal na Sociedade Nacional dos Gravadores Portugueses, em Lisboa; participei da restauração de palacete georgiano da Cambridge House, em Londres; e conheci vários artistas de vanguarda que atuavam em Portugal.
De volta ao ES, em 1969, tentei abandonar a pintura fazendo dois cursos na Ufes (Economia e Licenciatura em Ciências) e dando aulas para professores e crianças. Entretanto, em 1974, após casar e mudar para a Barra do Jucu resolvi me dedicar exclusiva e profissionalmente às artes. Em 1979 inaugurei meu ateliê, que continua aberto ao público.
O escritor que varia em forma, transitando pela poesia, crônica, ensaio, roteiro ou romance, não causa estranheza ao público. O conteúdo da sua obra revela sempre a mesma identidade. Do pintor é cobrada insistentemente a sua fixação em certa forma, estilo, temática, cores e até em materiais que usa. Não se deve esquecer que arte é o tipo de relação que se estabelece entre a peça oferecida pelo artista e o observador. A forma deve sempre servir ao conteúdo. O artista deve optar pelo melhor veículo para que o conteúdo (sua ideia, mensagem) alcance o público.
A exposição PAISAGENS CAPIXABAS CAPRICHADAS, que já está aberta com entrada franca, poderá ser visitada todos os dias das 9 às 18 horas. Permanecerá até 31 de março de 2013, e pretende sensibilizar o público com a beleza original da nossa paisagem.
Retomo o tema dos anos 1970, ainda mais aflito. A violenta e rápida transformação da nossa paisagem, principalmente do litoral, foi acelerada, comprometendo irreversivelmente a nossa identidade. Quando expus paisagens pela primeira vez na Sede Comunitária da Barra do Jucu, a proposta era caseira. Denunciávamos a ocupação irresponsável e desordenada do entorno da Barra e da Praia da Costa, acelerada com a abertura da Rodovia do Sol e com a conclusão da 3ª Ponte, e pedíamos a preservação de Jacaranema, última mata de restinga do litoral de Vila Velha. O sucesso parcial foi alcançado? Jacaranema continua suspensa por um fio. Ainda é área particular, pois os proprietários não foram indenizados na forma da Lei.
Pintando com capricho paisagens capixabas pitorescas e muito populares, procurei destacar e valorizar nossas características, tentando mostrar que persiste como política de Estado a demolição da nossa identidade física, psicológica e cultural.
Kleber Galvêas, pintor Tel. (27) 3244 7115 ateliegalveas@gmail.com |