Durante o “Trote da Cidadania” na UVV (2010) fui o palestrante
da noite de recepção aos calouros dos cursos daquela universidade.
O tema proposto por eles: “A Arte como transformadora da vida”,
me entusiasmou.
Foi interessante para mim, pintor local, mostrar para quase 400 estudantes atentos,
a influência da perspectiva artística em nossas vidas. Eles iniciavam
a última etapa da formação acadêmica, que visa preparar
cidadãos para servirem à sociedade, em diferentes áreas
profissionais no mundo objetivo.
A maneira eficiente para transformarmos a vida pela arte é provocar,
interessar e sensibilizar pessoas na troca de experiências. Essa relação
se faz através dos diferentes tipos de arte do espaço ou do tempo,
mas ela só acontece quando alguém se sensibiliza apreciando as
obras criadas pelos artistas e necessariamente captadas por um dos sentidos
do observador. Não existe arte sem público.
A vivência proporcionada a qualquer indivíduo por algo (abstrato
ou concreto) elaborado por outra pessoa, que toca o espírito propiciando
uma percepção estética destes objetos ou fenômenos
criados, é arte. A natureza da arte não está na obra em
si, mas na relação obra/observador. Amor e arte são impossíveis
sem parceiros. Daí o grande interesse dos artistas pelo público
e pela crítica.
Ser artista não é pertencer a uma classe especial de homens, mas
ter atitude e interagir, pois todo homem comunicador é um artista especial.
Um exemplo prático de como a vivência de experiências artísticas
e o interesse por elas são úteis à nossa percepção
do mundo, melhorando nosso cotidiano, ilustrou a palestra:
Imagine as famílias “A” e “B”, morando nos apartamentos
“1” e “2”, na cobertura de um prédio. Ambas gostam
de esporte, shopping, igreja, parque de diversões, praia... Os filhos
estudam na escola do bairro e os pais têm empregos equivalentes. Vizinhos
de porta têm ótima convivência no corredor, elevador, área
de lazer e confraternizações, mas sem intimidade.
Nos dois apartamentos, quando as famílias lanchavam preparando-se para
mais um dia de escola e trabalho, acidente semelhante ocorreu nas duas mesas:
o café foi entornado sobre a toalha.
A família “A” arma o barraco condenando veementemente o infrator.
Discutem sobre falta de modos, trabalho adicional, preço da água
e sabão, fatos desagradáveis do passado... E a discussão
continua dentro do carro na saída da casa. O motorista com a atenção
prejudicada bate no ônibus estacionado. Todos lamentam o prejuízo
e o incômodo, esquecendo o café derramado.
A família “B”, além das atividades em comum com os
vizinhos, gosta de freqüentar museus, exposições de arte,
bibliotecas, teatro, audições de música, poesia, e conversar
sobre esses assuntos. Quando a mancha de café se espalhou sobre a toalha,
alguém apontou a semelhança dela com uma pintura vista por todos
eles em exposição recente. O diálogo transcorreu sobre
a beleza dos castanhos da mancha, formas que surgiram e suas metamorfoses.
Conscientes do trabalho adicional, lavar a toalha, o acidente em “B”
não extrapolou a sua própria dimensão. Antes propiciou
momentos agradáveis de percepção estética e convivência.
Tendo a sensibilidade lapidada pela arte, a família “B” chegou
tranqüila à escola e ao trabalho. Com espírito leve e agradável
sensação de paz, principiou um bom dia.
Kleber Galvêas, pintor. Tel. (27) 3244 7115 www.galveas.com janeiro, 2011
Se achar legal, favor repassar para amigos. Grato, Kleber