O MUSEU ESTÁ SE VESTINDO?
O Museu Ferroviário da Vale do Rio Doce, em Vila Velha, desta vez, acertou
na programação. Apresentará, em sua próxima exposição,
um artista atuante no Espírito Santo, e dos consagrados: Hilal Sami Hilal.
Nosso desejo é que Hilal obtenha grande êxito, marque época,
abrindo este espaço privilegiado para o novo nas artes em nosso estado.
O artista veterano sabe que o novo não é o exótico; está no
nosso meio. Exige apenas nossa maturidade crítica, atenção
e a chance para se revelar.
A crítica feita por mim no texto anterior “O Museu Está Nu”,
não teria sentido se a Vale pagasse pelo que faz, assumisse os custos
das “experiências estéticas” que nos proporciona, sem
deduzir do IR esses investimentos de mais de meio milhão por exposição.
O fato é que a conta cai no nosso bolso. É dinheiro público
muito mal aplicado (pela Vale) em Vila Velha, enquanto o artista local permanece
anônimo e preterido pelas empresas e governo.
Da gastança no vernissage supimpa (restrito irregularmente a convidados
da empresa) colhemos frequentemente observações prosaicas: “vou
lá só para beber bem e encher a pança”.
A ausência do jornalismo investigativo na mídia cultural (tão
eficiente na área política, policial, econômica e esportiva),
a cumplicidade do Estado (que não cumpre o Art. 215 da Constituição)
e a insistência provinciana do Museu Ferroviário em prestigiar preferencialmente
o exótico, determinaram (por força de gerência do capital)
um desequilíbrio na promoção da cultura artística
estadual. Ao longo dos anos sedimenta-se a impressão de que tudo que se
faz aqui é secundário; e a maior parte da produção
local permanece oculta...
Cada um tem o direito de fazer o que quer com o seu dinheiro. Mas quando o dinheiro é público,
a mídia e o Ministério Público devem estar atentos. Deveriam
abrir a caixa-preta financeira do Museu Ferroviário, e de outras instituições
que recorrem as Leis de Incentivo à Cultura. No site www.galveas.com ou
no meu livro “Identidade Capixaba” podem ser encontradas diferentes
denúncias de desvios nesta área.
No Palácio Anchieta, ante-sala do governador, estão penduradas
duas telas de Homero Massena: uma rasgada, há décadas; a outra
suja e com verniz “artizan” escurecido.
Se o governo não consegue enxergar a decadência e o descaso para
com a cultura em seus íntimos aposentos; nem desenvolver a política
cultural prometida quando da eleição, e que foi respaldada pelo
voto popular, é sinal de envelhecimento precoce e acomodação.
Perdeu o interesse por nossa identidade.
Em assim sendo, parabéns à Vale por nos mostrar de novo o grande
Hilal. Votos para que o sucesso desta exposição venha levar a direção
do Museu Ferroviário a uma reflexão, e o aproxime do Espírito
Santo. Tenha algo a declarar.
Nada é mais contemporâneo, na hora decisiva da globalização,
do que a valorização da identidade. Na globalização,
ao contrário da matemática, os diferentes se somam; cópias
se dissolvem no ar; e os iguais pouco acrescentam.
Quinhentos anos depois de Galileu abjurar, forçado pela religião,
filósofos descobriram que durante este tempo cientistas achataram a nossa
Terra. Universalizaram as oportunidades, energia e a informação.
Vivemos num mundo plano, de comunicação global instantânea.
Artistas e produtores culturais éticos desenham um novo relevo, destacando
diferenças e valorizando especificidades. Procuram deter a fúria
do rolo compressor do nivelamento e a homogeneização, revelando
a grandeza e a diversidade do espírito humano, produzindo Arte e resgatando
a imprescindível interação com o público. Nossos
artistas não devem ser ignorados, estão próximos e operantes.
Atenciosamente, Kleber Galveas
Tel. (27) 3244 7115 atelie@galveas.com www.galveas.com .