MULTILATERALIDADE NA ARTE ATUAL

Li numa pipa, no céu de Copacabana, uma frase interessante: “Artista não é uma classe especial de homens, mas todo homem é um artista especial”.
Na nossa intimidade, algo mais, encontrado na natureza, ou inspiração, gerou uma idéia. Dar sentido a essa idéia, para sensibilizar outros homens, é ser artista. Cada qual do seu jeito.
Diante de super-habilidosos (isto é virtuoses) ou de especialistas em provocações artísticas (com mais aparato, nem sempre eficientes) e de alienígenas (exageradamente valorizados pelo nosso provincianismo) não devemos nos acanhar. Marketeiros inteligentes e com bom jogo de cintura, eles aparecem, passando a idéia de que são mais especiais.
O artista atual busca qualidade na sua comunicação, pela multilateralidade, onde os diferentes somam. Superando viseiras e intransigências da arte contemporânea, é vanguarda. Liberdade/clareza, autenticidade/audácia, versatilidade/inovação, são o seu diferencial. Ele valoriza o público, sabendo que a sua obra só acontece se percebida, e que sua função é fazer nossa vida mais cheia de experiências, despertando nossa consciência para fenômenos estéticos. O café derramado na toalha da mesa para o espírito rude é só problema, mas para iniciados, a forma da mancha, colorido, nuance e texturas podem proporcionar prazer, além do problema. Cultivar essas percepções, no cotidiano, é vivenciar a arte. Há 500 anos, Leonardo da Vinci sugeria a apreciação das manchas dos velhos muros romanos.
Sensível ao nosso tempo, o artista atual encontra, na diversidade dos meios (literatura, pintura, música, cinema, internet...) o mais eficiente ou a combinação deles, para apresentar ao público sua obra, naquele momento.
Na pintura, não procede como o antigo egípcio submisso à “lei da frontalidade”; nem como o contemporâneo Picasso, fiel a fases com manias de cores. Ele quer a melhor forma para veicular sua idéia, com a liberdade que experimenta, sabendo que a prisão mais eficiente é a que se constrói para si mesmo. Assim como o escritor que dependendo do assunto, se expressa na forma de diálogo ou monólogo, poesia, conto ou romance; como o músico, que de acordo com o tema, opta por compor uma música lenta ou ligeira, e ainda escolhe, entre diferentes arranjos, o ideal para envolver o ouvinte; o pintor atual transita por estilos, técnicas, materiais e suportes, para melhor expressão da sensação que deseja transmitir.
Na Barra do Jucu, acompanhei a degradação da paisagem em seu entorno. Quis registrar minha impressão, fui impressionista.
Nos anos 80, indo além das nossas fronteiras tentando contar histórias, com ênfase em alguns aspectos, fui expressionista.
Nos últimos anos do milênio passado, atento à “Era da Incerteza”, pintei coleções abstratas. A última, em 1999, lembra a vertigem de Alice ao cair no buraco, quando perseguia o Coelho das Horas, no início da aventura no País das Maravilhas.
Performances inspiradas em Diógenes, 300 a.C. (Praça é praça, não?) e instalações com base na História (Robério Martins) ou em observações científicas (A Vale, A Vaca e a Pena) são do repertório do meu ateliê, com portas sempre abertas ao público.
Os fundamentos desta estética atual, nascida da velocidade (futurismo) e desenvolvida na explosão da comunicação, oferecem ao artista um horizonte amplo. Se desviarmos o olho do umbigo e seguirmos em frente (sem viseiras) observando todos os lados, não avistaremos o futuro, mas caminharemos com mais prazer, segurança e arte.
Kleber Galveas, pintor. Tel. (27) 3244 7115 www.galveas.com 12/2008