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MORTE ANUNCIADA: CONFIRMADA!

Até a BR 101 ter um novo traçado e ser asfaltada (1954), quem saía de Vitória rumo ao sul passava forçosamente pelo centro da Barra do Jucu, e de lá, imbicando para Amarelos, passava ao lado da exuberante lagoa de Jabaité (com “i” e não “e”).

Essa era a maior e mais profunda lagoa de Vila Velha, muito conhecida e famosa, no passado, pelas ilhas flutuantes e pela ligação com a fazenda dos Jesuítas, em Araçatiba (do séc. XVI ao séc. XVIII) e por sua localização, beleza, história, lendas...

Braz, vizinho da lagoa afirma: “quando faz sol durante 3 ou 4 dias, a lagoa seca quase que completamente. Acabou.”

Na década de 60, a drenagem de propriedades agrícolas em seu entorno fazendo a lâmina d’água abaixar cerca de 1 metro encolheu a lagoa e as suas 5 ilhas flutuantes, que se moviam quando ventava, ficaram fixas em uma das margens.  

Até início dos anos 70, pesquei em Jabaité. A lagoa era rica em peixes, entre os quais: morobá, camboatá, cará, sairu, traíra, bagre, muçum, piaba. Era muito visitada por bandos de aves migratórias estre essas: irerê, patos, martim-pescador, e marrecos. Nas suas margens avistávamos: jaçanãs, socós, saracuras, codornas, perdizes e garças. Meu vizinho Joaquim (1974) criava em seu quintal 28 jacarés apanhados em Jabaité. Por ser perene e contígua à “Boca do Mato,” a lagoa era sempre visitada por animais nativos da mata atlântica.

A região, no passado, sofreu seca mais severa do que a atual, mas a lagoa nunca fora reduzida como agora, segundo antigos moradores.

Em 2013, após fortes chuvas, uma ilha flutuante surgiu de novo na lagoa. Mas, a partir de 2016, a água da lagoa foi sumindo rápida e misteriosamente. Cercas de invasões estão sendo colocadas onde, há 1 ano, havia água.

Alcançando a turfa oleosa do subsolo, o fogo colocado para limpar o terreno vai provocar problema semelhante ao que bombeiros enfrentam na Serra.

Leia a seguir uma provocação artística, que pretendia despertar o interesse por nossa lagoa. Crônica publicada há 10 anos.

As fotos anexadas foram tiradas no dia 19 – 04 – 2017. A faixa de areia do primeiro plano era a prainha da lagoa.


JABAITÉ, LAGOA ESQUECIDA. (Setembro, 2007)

Em Salvador, Abaeté é uma lagoa escura, arrodeada de areia branca. Na Barra do Jucu, Jabaité é uma lagoa negra, cheia de mistérios.

Na infância, de 1950 a 55, no inverno e no verão, fiz viagens de São Mateus, onde morava (nordeste do Espírito Santo), até Dores do Rio Preto, casa dos meus avós (sudoeste do ES).

Não havia estrada asfaltada. O único caminho, ligando Vitória ao sul do Estado, passava pela Praça da Barra do Jucu. Dali, ele seguia para oeste. Mais uma légua de chão batido alcançava a lagoa de Jabaité, com suas cinco ilhas flutuantes. Majestosa, grande, profunda, de cor negra, e magnificamente emoldurada por várzeas e morretes, tendo ao poente o monte Moxuara se destacando da serra azul.

O município de Jabaité fora extinto havia poucos anos, repartido entre Vila Velha, Cariacica e Viana, em consequência da dispersão dos moradores, iniciada com a expulsão dos jesuítas, que tinham ali a Fazenda de Araçatiba, uma das maiores do Brasil, e culminada com a mudança radical da via de trânsito (1955). O Rio Jucu, seus afluentes e canais foram abandonados pelas canoas, com a construção da Br. 101 asfaltada, que liga Vitória ao Rio de Janeiro. A nova estrada passava ao largo da Lagoa, da Barra e do centro de Vila Velha, chegava à Capital por Cariacica e São Torquato. Com a divisão do município de Jabaité, a lagoa e suas lendas ficaram para Vila Velha e caíram no esquecimento.

As viagens da minha família eram feitas em jeep. Minha mãe sempre grávida (seis filhos em oito anos) preparava uma farofa de galinha para comermos em Jabaité. No caminho apostávamos em qual margem da lagoa encontraríamos as famosas ilhas flutuantes. O prêmio era o coração da penosa da farofa. Uma bússola funcionava como roleta de quatro opções. Meu pai sempre ganhava. Demoramos a descobrir sua estratégia: antes de avistarmos a lagoa ele parava o carro com uma desculpa e, despistando, estudava a direção do vento.  As ilhas tinham arbustos que funcionavam como velas...

A origem dessas ilhas se deve a montículos da margem, ricos em raízes e turfa oleosa (baixa densidade) que se desprenderam após uma cheia mais forte no passado. Embora fosse fato observável, as ilhas andantes ganhavam uma dimensão misteriosa, enquanto traçávamos a farofa com guaraná, ouvindo as lendas de Jabaité: “Canoa de bronze”, “Mulher de 10 metros”, “Caboclinhos”, “Caravelas naufragadas”, “Tesouro dos jesuítas”, “Assombrações”, “Piratas”, “Correrias dos índios”...

Para aproveitar a várzea, como pastagem, drenaram a lagoa (1960/70), e as ilhas flutuantes se fixaram. Localizada na oliocolândia (vasa rica em óleo, pesquisada por Almeida Cousin como combustível alternativo) a lagoa está sendo sufocada pela expansão imobiliária. Suas lendas estão caindo no esquecimento, junto com D. Zilda, Dulcineia, Braz, Seu Caboclo, oliocas e o interesse por nossa identidade.

Kleber Galveas, pintor Tel. (27) 3244 7115 www.galveas.com setembro, 2007.


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