Em 1978, com entrevistas e exposição de pinturas na Sede Comunitária
da Barra do Jucu, procurei chamar a atenção para a agonizante
mata do Jussará, hoje bairro habitado chamado Ilha da Jussara. Esta mata,
fixada sobre um conjunto de ilhas em área alagada, ficou preservada de
incêndios ao longo dos séculos. Foi nesse ambiente, com árvores
e samambaias gigantes, diversos tipos de bromélias, orquídeas
e animais, onde conheci tagibebuia, samuma, sumaré e o chupati: o menor
marsupial da América.
O Jussará foi loteado. Em pouco tempo as árvores foram cortadas;
as samambaias, transformadas em xaxins; a terra vegetal e areia, pirateadas;
drenaram e aterraram tudo. Não sobrou vestígio do que era.
Com a morte do Jussará, me interessei por Jacaranema. Com o apoio da
Banda de Congo da Barra conseguimos que a Prefeitura de Vila Velha desapropriasse
e o Governo do Estado tombasse Jacaranema. Ações confirmadas várias
vezes ao longo de 33 anos, pois o governo ainda não cumpriu a sua parte,
indenizando o proprietário, como manda a Lei, para que o local seja público
de fato.
No princípio da década de 1980, no Conselho Estadual de Cultura,
fui escolhido relator do processo de Tombamento da Igreja de Viana. Tentei proteger
seu entorno impedindo a ocupação da única Praça
da Cidade. Loteamento aprovado pela prefeitura permitia a construção
de doze imóveis naquela Praça: um da igreja, um da prefeitura,
e os demais particulares.
Na década de 1990, portanto 100 anos após a ocupação
de Copacabana, que possui ruas largas e várias praças, tentei
influir na ocupação da Praia da Costa expondo pinturas expressionistas
e publicando textos. Ela lamentavelmente ficou com paredões a beira mar,
sombras extensas na praia, ruas estreitas e sem nenhuma praça.
Na década de 2000, com a instalação artística “Praça
é praça, não?” (veja em www.galveas.com/atividades),
que se consistiu em panfletagem e pinturas em telas emolduradas e fixadas no
tapume da obra, então só iniciada, tentei impedir a ocupação
da Praça Principal de Vila Velha, com a construção do prédio
“Titanic”.
Na década de 2010, foi a vez do Cais das Artes, apelidado de “Masmorrão”.
Tentei mostrar a impropriedade do local escolhido para sua construção,
na Praça do Papa, em Vitória. O projeto volumoso do arquiteto
que não foi premiado no Espírito Santo, pois aqui não houve
concurso, está sendo edificado em área pública semelhante,
mas muito menor do que o Aterro do Flamengo.
No Rio, ambiente cultural mais independente e progressista, cariocas expulsaram
de sobre as águas da Lagoa Rodrigo de Freitas uma gigantesca aranha de
ferro toda amarela, que a artista contemporânea Tomie Ohtake, havia instalado
ali.
Aqui na província, enquanto mentalidades tacanhas se impressionam com
nomes, títulos alienígenas e aceitam passivamente essas violências
na ocupação de espaços públicos; no Rio, Élio
Gaspari (A Gazeta, 27/11/2011) denuncia o uso do “aríete Niemeyer
para arrombar o Aterro do Flamengo, com a construção de uma casa
de espetáculos com três mil lugares”.
Se quisermos preservar traços da nossa identidade e uma razoável
qualidade de vida em nossas cidades, precisamos valorizar o bem comum e aprender
a reagir, como fazem os cariocas.
Que a minha coleção de fracassos em propostas ambientais seja
alerta ao bom senso dos governantes dos três poderes, universidades, sindicatos
e associações de classes. Apelo aos capixabas, natos e adotados,
para que somem esforços na preservação de nossos valores
e na construção de um lugar agradável para vivermos.
Kleber Galvêas, pintor. Tel.: (27) 3244 7115 www.galveas.com