A CIDADE E O VENTO
Ouvindo falar em poluição atmosférica das cidades, pensamos
em automóveis e na construção civil. É certo que
estas são fontes poluidoras sempre presentes nestes ambientes. Entretanto
a insistência nestes fatores, aqui no Espírito Santo, tem colocado
uma cortina de fumaça em nossos olhos. Objetiva minimizar a substancial
contribuição da atividade siderúrgica, impropriamente desenvolvida
na Ponta de Tubarão, a sotavento da Grande Vitória.
Belo Horizonte e outras capitais têm mais automóveis circulando
e maior atividade na construção civil do que Vitória. Entretanto
se você circular por estas cidades, vai observar famílias reunidas
nas varandas, muitas vezes comendo. Na nossa orla (menos vulnerável a
automóveis e construções) não se observa, de ponta
a ponta, a utilização das varandas abertas. Não adianta
limpar; a poeira negra, densa e viscosa, emporcalha tudo em minutos. Anula este
espaço privilegiado das casas e apartamentos.
A cor, brilho, densidade e o teste do imã denunciam a contribuição
da siderurgia á poeira atmosférica na Grande Vitória. Belo
Horizonte está localizada numa “cratera” de minério
de ferro. Entretanto se esfregarmos um imã na poeira mineira, ela não
dança no compasso dos seus movimentos.
Vivemos dentro de uma calota de ar saturado de partículas de ferro. Usando óculos
com lentes avermelhadas (de camelô da esquina) podemos ver a densa borda
desta grande calota, olhando para o horizonte sobre o mar. Encontramos ferro
passando um imã na poeira, que chega a todo instante em nossas casas.
Nossa Constituição e o site do Ministério da Saúde
têm a justificativa e o roteiro para resolver este problema. Falta aos
nossos políticos, gestores do interesse social, motivação
para trabalhar neste sentido.
Não haverá ação legal eficiente, enquanto os partidos
dependerem da contribuição em dinheiro das grandes empresas, para
darem mais brilho e menos conteúdo às suas campanhas eleitorais.
Seremos sempre vendidos no mercado livre dos interesses particulares. A melhoria
das condições atmosféricas só acontecerá com
uma reforma política que alcance o financiamento das campanhas eleitorais.
Não é humano (racional) o governo que concede licença para
expansão de uma indústria, que vem se mostrando incompetente para
resolver os problemas que criou em área densamente povoada. Lutar, a beira
mar, contra a força do vento nordeste capixaba; querer armazenar e processar
ali, quantidades fabulosas de ferro: é temeridade quixotesca; ainda que
esses quixotes modernos tenham recursos quase infinitos, inteligência,
e apurada formação acadêmica. O desempenho deles na área
financeira, elevando o preço do minério e multiplicando o patrimônio
da empresa, é atestado de altíssima competência em gestão
financeira. Talvez esteja neste retumbante sucesso empresarial a maior dificuldade
para uma reflexão humana. Humildade é condição para
se reconhecer o erro e arrumar as malas, se afastar de Tubarão. Dois ou
três km para o interior, segundo Rusch e Bergman, minimizariam o problema
com o vento.
Há mais de 2 mil anos, cidadãos fenícios conseguiram impedir
que oficinas de tingir tecidos se instalassem a sotavento das grandes cidades.
O pigmento purpúreo utilizado era obtido pela putrefação
de moluscos apanhados no Mediterrâneo. O mau cheiro uniu os moradores,
para esta conquista no primitivo Líbano. Nossos imigrantes libaneses nos
ensinaram a arte do comércio, mas esqueceram da milenar lição
ecológica. A Associação Comercial de Vitória, dos
anos 60/70, defendendo sua praça, apoiou a instalação das
indústrias em Tubarão. A convivência com elas (30 anos) e
observação de seguidos fracassos para reduzirem a poluição,
exigem reflexão e ação.
Kleber Galveas – pintor. www.galveas.com Tel. (27) 3244 7115 05/2007