Pinturas |
UMA
PANELA DE BARRO – publicado
em A Tribuna,
21/09/2013 Montar,
na antiga
residência do Mestre, o Museu-Atelier Homero Massena em Vila
Velha, 1986, o
primeiro de Artes no Espírito Santo e o único, até
hoje, com coleção em
exposição permanente, foi uma corrida frenética de
obstáculos durante seis
meses. Massena
falecido havia
12 anos, não deixou casa própria. Seguindo
orientação do pneumologista Jayme
dos Santos Neves, A viúva Edy havia mudado para apartamento
próximo à antiga
residência. Com morte anunciada pelo câncer, ela hospedou
no apartamento onde
morava havia três anos três zelosas irmãs e um
cunhado que tinham
vindo do Rio, Paraná e Rio Grande do Sul, para cuidar dela
nos últimos
dias. O movimento, visando à criação do
Museu, iniciado pela viúva do
artista e amigos tinha que ser acelerado. Queríamos o museu
inaugurado por Edy,
que entregaria as chaves ao prefeito. Precisávamos
desapropriar a casa tombada pelo Conselho Estadual de Cultura. Ela
estava
arruinada, invadida por cupins e ocupada por mendigos que arrombaram
uma janela
e, dentro, cozinhavam em fogão feito com paralelepípedos,
usando como lenha
tábuas retiradas do forro e do assoalho. O
Colégio Godofredo
Schneider, construído pelo Governo Estadual no terreno da antiga
Fábrica
Garoto, atrás da residência dos Massenas, despejava no
quintal da casa parte da
água da chuva que caía sobre o seu enorme telhado. Como a
casa fica em nível
inferior ao da rua, quando chovia formava-se uma lagoa no quintal e
dentro da
residência, o que estava desintegrando as paredes onde existiam
pinturas
originais do Mestre. Hoje, todos os marcos das portas do Museu
apresentam um
corte de restauração feito a 40 cm do chão.
Embora sejam de peroba, eles
apodreceram na parte que ficava frequentemente submersa na água
estagnada. A
reforma era
urgentíssima, assim como a aquisição do acervo das
herdeiras, para que ele não
se dispersasse pelo Sul do Brasil, para onde as telas seriam levadas. Contamos
com o apoio
institucional dos prefeitos Vasco Alves, Aucélio Sampaio e
Carlos Malta (Vila
Velha teve três prefeitos em seis meses); e de investimentos de
empresários
locais esclarecidos: Helmut Meyerfreund, Jonice Tristão e Carlos
Lessa. As
grandes empresas multinacionais instaladas no Espírito Santo,
consultadas por
nós (Vale e CST), não perceberam o alcance social e a
nossa urgência, nos enrolaram
e recusaram apoio ao projeto. Montando
o Museu, que
exibe a obra do Mestre e reflete o estilo de vida do casal Massena,
nós demos
falta de uma peça relevante para o acervo: a antiga panela de
barro. Comprada
logo que chegou a Vila Velha, em 1951, foi escolhida após
verificação do seu
formato, espessura, cor, brilho e som. Quando recorri às
herdeiras para
resgatar a panela de barro, de onde, ao longo de vários anos
haviam saído
saborosas moquecas e quibebes, o espólio já ganhara novos
donos. Fui
informado de que a
panela velha de 40 anos, de paredes finas meio enjambradas, negras, com
brilho,
com som
de sino quando suspensa e batida no fundo com os nós dos
dedos, havia sido dada para a lavadeira da família. Fomos
até a casa dela. Lá
encontramos a panela furada, rachada e servindo de vaso para um
tinhorão. Dessa
panela de barro
tenho uma foto. Aparece no meio da mesa, com uma moqueca de pitu a
bordo, prato
principal do almoço oferecido pelos padrinhos Homero e Edy, no
dia do meu
casamento, em 1974. Kleber
Galvêas,
pintor. WWW.galveas.com tel.
(27) 3244 7115 setembro, 2013 |