SOMOS COBAIAS?

Desde Charles Darwin, naturalista inglês que pesquisou no Brasil e publicou “A Origem das Espécies” em 1859, sabemos que mudança no meio ambiente pode determinar fracasso de uns e sucesso de outros seres vivos.
O fumo foi disseminado pelo mundo quando da descoberta da América. Entretanto, muito antes disso “fumamos” compulsoriamente, do nascimento até à morte. Há cerca de 800 mil anos, 50 mil gerações passadas, o homem dominou o fogo e convive com a fumaça. Durante os longos períodos glaciais, que ocorreram desde então, e que duravam aproximadamente 10 mil anos, essa convivência foi bastante estreita. Quem não resistia à fumaça da fogueira, eternamente acesa dentro da caverna pouco ventilada, morria. Uma seleção se processou. Essas fogueiras, feitas com diferentes materiais combustíveis, produziam, algumas vezes, fumaça ainda mais tóxicas que o fumo. A nicotina estava presente pois é encontrada em quase todos os vegetais, que dependem dela para sua defesa contra fungos e parasitas diversos. Daí o uso do fumo de rolo, pelos nossos agricultores, na composição das caldas caseiras utilizadas no combate às pragas das plantações.
São dramáticas as histórias sobre os mineradores de enxofre, na Roma Antiga, e do carvão, na Revolução Industrial. Os coletores de sal de Macau, RN, têm seu drama contado por José Mauro de Vasconcelos, em “Barro Blanco”. A silicose, que liquida os trabalhadores nas pedreiras, em permanente contato com a sílica, é fato comprovado.
Sempre que há exagero na exposição a um produto, existe risco; representa desequilíbrio ecológico; é mudança no nosso meio ambiente.
Toda a Grande Vitória e alguns municípios do interior vivem dentro de uma calota, ou redoma, com ar saturado de partículas de ferro e de minério de ferro, com diferentes dimensões. Quanto mais distantes da fonte emissora, menores e mais perigosas são as partículas que respiramos. O tamanho dessa calota pode ser percebido usando-se óculos de camelô, que tenha lentes avermelhadas, e olhando-se para o horizonte sobre o mar, onde é mais distante. Sua composição pode ser pesquisada, em nossas casas, varrendo-se a poeira que nos chega todos os dias, para uma folha de papel, passando-se um imã (desses que enfeitam geladeiras) por baixo da folha. Faça você mesmo essa experiência.
Quando assistimos à violência das ações do governo contra o tabagismo (opção individual que requer investimento) e a sua atuação quanto à poluição atmosférica (que atinge a todos) ficamos confusos com esse desequilíbrio ou desvio ético.
Somos a primeira geração a viver neste ar saturado de ferro. Cobaias desprezíveis: as nossas Universidades não pesquisam; o Governo vem autorizando duplicações das empresas poluidoras da atmosfera, que não resolveram os problemas que criaram; oposição e situação estão felizes com as contribuições às suas campanhas eleitorais; as associações ecológicas agradecem patrocínios; médicos, principalmente otorrinolaringologistas, alergistas e pneumologistas, parecem satisfeitos com seus consultórios lotados; juristas dormem o sono dos bem assalariados; artistas, cientistas, religiosos, operários, estudantes e donas de casa, se calam seduzidos pela propaganda, por conveniência ou ignorância.
Infelizmente não existem assombrações e cobaias mortas não falam, embora estejam se remexendo em suas covas.
Kleber Galvêas, pintor. Tel. (27) 3244 7115 atelie@galveas.com www.galveas.com 04/05