“Desencanto” (1945) é um filme do premiado David Lean (“Doutor
Jivago” - 1965 “Lawrence da Arábia” - 1962 e “A
Ponte do Rio Kwai” - 1957). Nele o protagonista é clínico
geral em Londres, no princípio do séc. XX. Angustiado, diz à sua
amada que pretende trocar a medicina curativa pela medicina preventiva, uma
vez que seus pacientes com antracose, calicose e silicose estão condenados
a morrer com grande sofrimento, tentando respirar. Explica que essas doenças
pulmonares (adquiridas pela inalação de poeira do carvão,
siderúrgicas e pedreiras) não têm cura, mas seriam evitadas
com o controle da poluição. O médico do filme, entendendo
que não poderia remediar o irremediável, trocou Londres pela África
do Sul.
Dicionários trazem o verbete POEIRADA: “Bras. pop. Providências
mentirosas para iludir quaisquer reclamações populares”.
Recolhendo, sobre folha de papel, a poeira que chega às nossas casas
todos os dias, e passando um imã sob a folha, aprendemos a identificar
e avaliar a presença de ferro nesta poeira. Nosso governo, desinteressado
em desenvolver equipamentos simples para identificar e quantificar as partículas
que circulam no ar (segundo funcionária do IEMA - Instituto Estadual
do Meio Ambiente) ignora o problema. Insiste na poeirada: nomeia secretários
comprometidos; aceita estudos feitos sob o controle de empresas; prestigia
artistas capixabas que vivem longe daqui (Stênio Garcia, Eliza Lucinda)
e que emprestam suas imagens para propaganda maciça; pretendendo nos
convencer que está tudo limpo.
Numa jogada displicente, para levantar poeira, sambistas levaram para a principal
vitrine brasileira (carnaval da Sapucaí) uma imagem sacana do Espírito
Santo: o nosso chocolate (que não é mais o mesmo) Tubarão
(responsável por nosso inchaço agudo) panelas de barro (de autenticidade
duvidosa) e, gratuitamente, prostituíram Maria Ortiz. Se a questão
era uma dose de sensualidade, porque não Luz Del Fuego? Moça
educada em colégio de freiras, parente de senador, naturista e vedete
que se apresentava dançando com cobras (símbolo da Caprichosos
de Pilares) de vida sensual muito divulgada pela mídia nacional, sua
identificação pelos cariocas seria fácil (viveu e fez
sucesso no Rio). A escola empoeirou nossa História, mas não despistou
nossos problemas atuais: liderança, poluição, educação,
segurança, transporte cultura e saúde (falta até aspirina,
outrora fabricada pelo IESP).
O castigo veio a galope: para a escola, o rebaixamento; para os capixabas que
desfilaram, a indiferença; para todos nós, um tiro no pé.
O desencanto com o governo que descuida ações culturais e ecológicas
que nos maltratam, deve ser expresso. Ele está na contramão da
nossa Constituição Federal (Art. 196 e 215). Revela a ponta do
iceberg formado pelo descaso com a nossa cultura: dos nossos professores, retirou
as horas de planejamento nas escolas; confisca obra de todo artista que expõe
em suas galerias; embora Educação Artística seja matéria
curricular de todas as séries do 1º Grau, o Museu de Arte do Espírito
Santo, funciona como galeria; o Museu do Negro, dilapidado, cai aos pedaços;
há três anos fechou-se o Conselho Estadual de Cultura...
A Vila Izabel caprichou na avenida. Venezuelanos estão satisfeitos com
o investimento. O desfile da eterna Vila do Noel foi muito aplaudido. Esse
sim, inteligente, encantou!
Kleber Galvêas – pintor Tel. 3244 7115 atelie@galveas.com www.galveas.com
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