Pinturas | AS ENCHENTES
(publicado em A Gazeta, 04/janeiro/2014) Ao longo de mais de um século jornalistas e escritores brilhantes, todos os anos, escrevem páginas e mais páginas sobre esse assunto. Populares inundam as seções de “0pinião” e “Cartas”, com sugestões e reclamações bem fundamentadas. Por alguns dias esse é o tema dominante. O verão, temporada de liberdade, festas e alegria, quase sempre principia com um drama de dimensões nacionais e, para muitos, com tristeza profunda. Durante a congada, que percorreu ruas na Barra do Jucu levando o mastro com a bandeira de São Benedito, fui interpelado por brincantes: “Você não vai escrever sobre as enchentes?” Respondi a todos que isso era “chover no molhado”. Senão, vejamos algo que não escrevi: “As chuvaradas de verão, quase todos os anos, causam inundações desastrosas. Além da suspensão total do tráfego, com prejudicial interrupção das comunicações entre os vários pontos da cidade, essas inundações causam desastres pessoais lamentáveis, muitas perdas de haveres e destruição de imóveis. De há muito que a nossa engenharia municipal se devia ter compenetrado do dever de evitar tais acidentes urbanos. Uma arte tão ousada e quase tão perfeita, como é a engenharia, não deve julgar insolúvel tão simples problema. A cidade não pode estar à mercê de chuvaradas, para viver a sua vida integral. Como está acontecendo atualmente ela é função da chuva. Uma vergonha! Pelo que me dizem os entendidos, o problema não é tão difícil de resolver como parece fazerem constar os engenheiros municipais, procrastinando a solução da questão. Cidade cercada de montanhas, que recebe violentamente grandes precipitações atmosféricas, o seu principal defeito a vencer era esse acidente das inundações. Infelizmente, porém, nos preocupamos muito com os aspectos externos, com as fachadas, e não com o que há de essencial nos problemas da nossa vida urbana, econômica, financeira e social”. Extrato da crônica “As Enchentes” do genial Lima Barreto, publicada no jornal carioca “Correio da Noite”, em 19 de janeiro de 1915. Há 99 anos! Sem comentários. Kleber Galvêas, pintor. Tel. (27) 3244 7115 www.galveas.com ateliegalveas@gmail.com janeiro, 2014 |